terça-feira

29 de Março

2005/03/29 - bicentenário da Biblioteca Pública de Évora

Biblioteca Pública de Évora


O Cineclube da Universidade de Évora e o Páteo do Cinema (Núcleo de Cinema da SOIR Joaquim António de Aguiar) trabalham em conjunto há quatro anos.

Com a programação de sessões semanais de cinema no Auditório Soror Mariana e a organização do FIKE – Festival Internacional de Curtas Metragens de Évora, em Novembro, trazemos a Sétima Arte à cidade de Évora.

Enquanto agentes culturais activos e com presença permanente na vida cultural da cidade não podiamos ignorar o desafio de participar nas Comemorações do Bicentenário da Biblioteca Pública de Évora.

A ideia de trazer o Cinema dos Livros, das Bibliotecas e da Leitura foi mais do que um desafio interessante.

Como abordá-lo se o Cinema envolve todas as Artes? A forma mais evidente (mas também redutora) seria a de programar filmes que fossem o produto de uma adaptação directa da Obra Literária. Escolhemos um caminho diverso. Procurar o Cinema acessível onde os Livros, as Bibliotecas e a Leitura estivessem presentes, mas também onde fosse visível essa união dos Saberes, da Técnica e das Artes que definem o CINEMA e os homens que tornam isso possível.

É esta a filosofia de um ciclo de cinema pouco ortodoxo.
Um filme por mês, na última terça-feira.
Uma outra forma de LER o Bicentenário da BIBLIOTECA.


autografia
2004, documentário


sou um homem
um poeta
uma máquina de passar vidro colorido
um copo uma pedra
uma pedra configurada
um avião que sobe levando-te nos seus braços
que atravessam agora o último glaciar da terra

o meu nome está farto de ser escrito na lista dos tiranos: condenado
à morte!
os dias e as noites deste século têm gritado tanto no meu peito que
existe nele uma árvore miraculada
tenho um pé que já deu a volta ao mundo
e a família na rua
um é loiro
outro moreno
e nunca se encontrarão
conheço a tua voz como os meus dedos
( antes de conhecer-te já eu te ia beijar a tua casa )
tenho um sol sobre a pleura
e toda a água do mar à minha espera
quando amo imito o movimento das marés
e os assassínios mais vulgares do ano
sou, por fora de mim, a minha gabardina
e eu o pico Everest
posso ser visto à noite na companhia de gente altamente suspeita
e nunca de dia a teus pés florindo a tua boca
porque tu és o dia porque tu és
a terra onde eu há milhares de anos vivo a parábola
do rei morto, do vento e da primavera
Quanto ao de toda a gente – tenho visto qualquer coisa
Viagens a Paris – já se arranjaram algumas.
Enlaces e divórcios de ocasião – não foram poucos.
Conversas com meteoros internacionais – também, já por cá
passaram.
Eu sou, no sentido mais enérgico da palavra
uma carruagem de propulsão por hálito
os amigos que tive as mulheres que assombrei as ruas por onde
passei uma só vez
tudo isso vive em mim para uma história
de sentido ainda oculto
magnifica irreal
como uma povoação abandonada aos lobos
lapidar e seca
como uma linha-férrea ultrajada pelo tempo
é por isso que eu trago um certo peso extinto
nas costas
a servir de combustível
e é por isso que eu acho que as paisagens ainda hão-de vir a ser
escrupulosamente electrocutadas vivas
para não termos de atirá-las semi-mortas à linha
E para dizer-te tudo
dir-te-ei que aos meus vinte e cinco anos de existência solar estou
em franca ascensão para ti O Magnifico
na cama no espaço duma pedra em Lisboa-Os-Sustos
e que o homem-expedição de que não há notícias nos jornais
nem
lágrimas à porta das famílias
sou eu meu bem sou eu
partido de manhã encontrado perdido entre
lagos de incêndio e o teu retrato grande!
Mário Cesariny In “pena Capital”, Assírio & Alvim

AUTOGRAFIA

Sinopse
Com este documentário pretende-se retratar, não o poeta e pintor Mário Cesariny, mas sim a sua vida, o seu percurso e a sua individualidade. Como espaço de acção privilegiou-se o seu quarto, por ser este actualmente a base da sua criação e da sua intimidade. É aqui que reside tudo o que não se perdeu.Sendo este um trabalho que vive sobretudo das questões colocadas (ausentes) e das respectivas respostas, optou-se por assumir como fio condutor um dos seus poemas - "Autografia" - que servirá de mote, através da sua análise para as questões intencionadas, de modo a que o filme assuma um carácter intimista, estabelecendo-se um diálogo entre quem o vê e quem é retratado. Neste documentário / registo existem vários planos: o de análise do poema; o das respostas; o do seu trabalho (exposto na sua intimidade) e o da nossa própria interpretação; uma espécie de respigar / reciclar de citações e de conteúdos que acabam por nos permitir uma apropriação de Mário Cesariny.Miguel Gonçalves Mendes



Actores e Técnicos
realização Miguel Gonçalves Mendes imagem Cláudia Oliveira, Dino estrelinha, Leonardo Simões, Hugo Azevedo, Hugo Coelho, Miguel Gonçalves Mendes, Nina Alves e Susana Nunes pós-produção de imagem_Andreia Bertini som_Patrick Mendes mistura de som_Mário Dias montagem_Maria Joana Figueiredo fotografia de cena_Susana Paiva voz off poema "autografia"_Paulo Reis figurino "Obituário"_Mariana Sá Nogueira
produção_JumpCut, 2004

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